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Caso Americanas – O quanto uma Governança “teórica” pode colocar em jogo a sobrevivência de uma grande empresa?

Temos visto nas últimas semanas vários desdobramentos sobre o caso Americanas e escândalo da dívida de R$ 20 bilhões, cujas explicações sobre o acontecimento ainda estão nebulosas. Em última atualização, empresa declarou dívidas de  R$ 43 bilhões com um total de 16.300 credores.

Mas quanto às dúvidas sobre inconsistências no balanço serem resultado de erro ou fraude, não há como rebater a segunda opção.

Uma governança corporativa sólida e princípios ESG estabelecidos, com certeza, teria evitado este grave problema, que ultrapassa um “erro” contábil e recai sobre a reputação da empresa no mercado, aos olhos do mundo.

O aprendizado com as falhas cometidas é necessário, mas vale o alerta de que: apesar de aprender, nem sempre será possível se recuperar, porque alguns erros têm raízes profundas.

Estrutura de governança corporativa e ESG – protegendo a reputação de uma organização

A definição de Governança Corporativa, segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselhos de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas.

As boas práticas de governança corporativa assumem o papel de converter princípios básicos em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da sua gestão, longevidade e o bem comum.

Os 4 princípios básicos que compõem a governança: transparência, equidade, prestação de contas (accountability) e responsabilidade corporativa, quando devidamente exercidos, resultam em um clima de confiança interna entre as empresas, assim como em suas relações com terceiros.

Transparência – No compartilhamento de informações, desde o desempenho econômico até os demais fatores (intangíveis), com a finalidade de disponibilizar aos stakeholders as informações de seu interesse e não apenas aquelas impostas por leis ou regulamentos.

Equidade – Tratamento justo e igualitário a todos os sócios e demais partes interessadas, colocando como prioridade seus direitos, deveres, necessidades, interesses e expectativas.

Prestação de contas (accountability) – Todos os agentes de governança devem prestar contas de sua atuação de maneira clara e concisa, assumindo integralmente as consequências de seus atos e omissões e atuando com diligência e responsabilidade, de acordo com as atribuições de cada papel.

Responsabilidade corporativa – Os agentes de governança corporativa devem zelar pela viabilidade econômico-financeira das organizações, reduzindo as externalidades negativas de seus negócios e operações e aumentar as positivas, levando em conta seu modelo de negócios e os diversos capitais, no curto, médio e longo prazo.

Enquanto inúmeras organizações ao redor do mundo têm se preocupado em profissionalizar a sua gestão, outras ainda compreendem os princípios de governança como “teoria”, similar à compreensão sobre o primeiro conceito de sustentabilidade em execução décadas atrás.

Mas a pandemia acelerou a necessidade de uma gestão empresarial de fato focada em questões sociais, ambientais e de governança e nunca se ouviu falar tanto em ESG como no período da pandemia.

Porém, o conceito ESG (Environmental, Social and Governance *Meio Ambiente, Social e Governança) veio para ficar e para “chacoalhar” as organizações a repensar se aquilo que dizem ‘ser’, de fato ‘são’ no mercado.

O conceito ESG é uma pauta que teve início de discussão em 2005, por meio do relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) em parceria com o Banco Mundial, intitulado Who Cares Win (Quem se importa, vence), que contava com a participação de instituições financeiras de nove países.

Mas o greenwashing (se intitular sustentável ou ESG sem práticas) não é algo que passa despercebido como acontecia tempos atrás, em que a desculpa de grande parte das organizações que não aplicavam o conceito de sustentabilidade era a de que “era caro implantar”.

Organizações têm avançado do “culto à aparência” para ações que comprovem sua conduta e valores em que acredita. O quanto o conselho está comprometido a guardar os princípios, valores, objeto social e sistema de governança da organização?

Quais têm sido os critérios quanto à escolha dos membros do Conselho para a formação de comitê que seja íntegro e que contenha pluralidade de perspectivas e experiências?

Algo é certo: não pode “parecer”, organizações têm sido e serão cada vez mais confrontadas quanto à sua conduta no mercado.

Caso Americanas – Governança Corporativa não pode ser “teoria” nas organizações

A grande empresa do segmento varejista integra índices considerados referência na Bolsa, como o Novo Mercado que engloba empresas com um “padrão de governança corporativa” altamente diferenciado, de acordo com a B3 e o ISE (Índice de Sustentabilidade Empresarial), direcionado a organizações com boas práticas ESG.

Mas mesmo estando entre as companhias que exercem boas práticas, a Americanas admitiu inconsistência bilionária em seus resultados, o que levou clientes, instituições financeiras e agentes do mercado a se chocarem pelo tamanho do prejuízo.

As dívidas, ao invés de serem atribuídas a instituições financeiras, entravam como despesas com fornecedores, o que não comprometia o resultado da empresa, ou seja, aparentava estar saudável no mercado, já que a dívida financeira e os juros não foram registrados corretamente, levando a impactos no resultado, EBITDA, dívida financeira e nível de alavancagem, assim como contas a pagar aos fornecedores.

Mas a questão que impacta o mercado, não está na operação, mas na ausência de transparência, de responsabilidade empresarial (accountability), ou seja, na ausência de uma sólida governança corporativa em prática.

Em outros casos de escândalo ocorridos, com exemplo do Banco Nacional, em que o prejuízo era repassado a uma conta que não era mostrada no balanço, era evidenciada ausência de controle na linha de defesa (board de conselheiros), que deveria partir da governança corporativa que não identificava o problema.

A ausência de um veredicto quanto ao caso não permite opiniões deliberadas, porém, um caso dessa gravidade não ter sido percebido pela governança corporativa mostra que os princípios não estavam sendo aplicados como deveria.

Papel do Conselho de Administração diante de conflitos

O conselho de administração assume a função de tomar decisões a favor do que seja melhor para a empresa, assim como o de supervisionar as ações da diretoria executiva.

Um Conselho Fiscal e Comitê de Auditoria são instâncias imprescindíveis para a promoção da eficiência e transparência na gestão organizacional. Enquanto o primeiro tem a responsabilidade de examinar as demonstrações financeiras do exercício social e dar seu parecer, cabe ao último, supervisionar a elaboração dessas demonstrações.

Algo que mais tem chamado à atenção em relação ao caso emblemático está no papel por parte do conselheiro de assegurar a transparência, já que cabe a esse profissional analisar se uma prática financeira que não é usual envolve risco de transparência na demonstração financeira.

Sem dúvidas, o caso recente da grande empresa varejista e tantos outros exemplos que infelizmente resultaram em escândalo, vêm da raiz de uma governança corporativa e de políticas ESG frágeis.

A governança representa a estrutura de uma empresa, assim como o board de conselheiros atua em prol da garantia do cumprimento dos requisitos necessários para que uma organização mantenha a sua boa reputação no mercado.

“Afrouxar” as regras infelizmente tem se tornado um comportamento recorrente em organizações ao redor do mundo, porém o melhor caminho para impedir que situações saiam do controle é manter a integridade por meio das boas práticas e, sem dúvidas, um board advisor consciente e atuante é o melhor caminho para isso.

 

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