O que a sua empresa discute mais: rotina ou futuro? Essa pergunta precisa ser feita com frequência nas empresas familiares.
Muitas empresas confundem atividade com direção: reuniões repletas de KPIs e resoluções operacionais substituem o debate estratégico necessário para garantir que a sucessão empresarial seja um processo planejado e não apenas uma transferência patrimonial.
De acordo com o artigo publicado pelo portal RH Para Você, foi mostrado que segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), empresas familiares representam cerca de 90% dos negócios no Brasil, geram aproximadamente 65% do PIB e empregam 75% da mão de obra privada.
Além disso, relatório da Fundação Dom Cabral aponta que 70% das empresas familiares não sobrevivem à primeira sucessão.
Com ampla experiência no ambiente corporativo, atuando como Advisor à frente da MORCONE, tenho auxiliado e orientado empresas, especialmente empresas familiares brasileiras a se estruturarem para chegar aos 100 anos.
Neste artigo, discuto sobre a importante parceria do conselho consultivo para uma sucessão empresarial estratégica efetiva que se traduz em longevidade.
Sucessão empresarial X sucessão patrimonial
É comum ouvir que “basta dividir o patrimônio”, mas transferir ativos não garante continuidade do negócio.
Em suma, a sucessão patrimonial resolve questões hereditárias; já a sucessão empresarial trata de liderança, decisões e sustentabilidade estratégica.
Conforme ressaltado em artigo publicado pelo portal Cana Online, patrimônio pode ser disposto em documento legal; já a liderança e cultura exigem processo.
Enquanto o primeiro é um ato jurídico, o segundo é um projeto de gestão que envolve: mapeamento de competências, desenvolvimento de sucessores, regras claras de governança, políticas de remuneração e mecanismos de resolução de conflitos.
Assim sendo, confundir um com outro é expor a empresa a riscos e, em vários casos, à dissolução.
O perigo das empresas que agem no automático e como identificar este comportamento
Lideranças imersas na operação frequentemente acreditam que “controle” significa rotinas, relatórios e medidas de curto prazo. Porém, operar no piloto automático costuma manifestar-se assim:
Sinais de alerta:
- Pauta de reuniões do conselho sempre idêntica, orientada ao mês a mês, como um ato meramente formal;
- Pouco ou nenhum tempo dedicado a cenários de longo prazo, inovação ou sucessão;
- Crescimento apoiado em fatores exógenos (demanda do mercado) mais do que em estratégia;
- Falta de critérios objetivos para seleção e avaliação de lideranças familiares.
Em resumo, estes sintomas reduzem a capacidade de adaptação e tornam a transição de comando um evento de alto risco.
Governança em empresas familiares: estruturar para que haja longevidade
Inegavelmente, a profissionalização da gestão é a alavanca que separa empresas resilientes das que dependem de improviso.
Governança em empresas familiares não é formalidade; é instrumento de previsibilidade e mitigação de conflitos.
Instrumentos essenciais:
- Acordo de sócios com regras claras sobre ingresso, saída e sucessão;
- Políticas de governança que definem papéis (conselho de família, conselho consultivo, diretoria), critérios de avaliação e metas;
- Matriz de competências para cargos críticos, cobrindo habilidades técnicas e comportamentais;
- Programas de capacitação e vivência prática, como rodízio planejado de funções para que futuros líderes conheçam diferentes áreas do negócio.
Em síntese, a aplicação disciplinada desses instrumentos aumenta a chance de que a empresa chegue à segunda e terceira geração com estrutura e valor preservados.
Conselho consultivo: função prática e agenda mínima
Um conselho consultivo bem constituído é o mecanismo que promove o “desconforto saudável”, ou seja, aquele questionamento externo que tira a liderança da bolha operacional. Como atuar, na prática?
Composição e perfil
- 4–7 membros, mesclando experiência setorial, financeira e em governança;
- Inclusão de pelo menos 1 membro com vivência em sucessão/people management;
- Mandatos e critérios de reeleição definidos.
Agenda mínima do conselho para sucessão
- Revisão anual do plano sucessório e da matriz de competências;
- Auditoria de benchstrength (estoque de talentos) e gaps críticos;
- Exame de cenários: sucessão planejada, incapacidade súbita, saída controversa;
- Validação de políticas de remuneração e de retenção para executivos-chave.
Já tratei em outro artigo que formalizar a atuação do conselho consultivo é mais do que criar um rito burocrático: significa dotar a empresa de uma instância capaz de avaliar cenários, definir políticas claras e monitorar indicadores de sucessão.
Um conselho ativo garante periodicidade de reuniões, ata com deliberações registradas, acompanhamento de metas de desenvolvimento de sucessores e alinhamento entre família, gestão e acionistas.
Enfim, ao transformar recomendações em processos documentados, como calendário de revisão do plano sucessório, matriz de competências e plano de contingência para afastamentos inesperados, a sucessão deixa de ser evento pontual e passa a integrar a estratégia de longo prazo.
Passos práticos (com prazos e entregáveis)
Para transformar intenção em execução, uma sequência pragmática funciona bem:
1) Diagnóstico (0–3 meses)
- Mapear funções críticas, riscos operacionais e lacunas de governança.
- Entregável: relatório executivo com mapa de riscos.
2) Plano de desenvolvimento de sucessores (3–12 meses)
- Definir metas, experiências previstas (vivência em outras áreas, projetos, formação).
- Entregável: trilha de desenvolvimento e cronograma.
3) Estrutura de governança e regras (3–6 meses)
- Atualizar acordo de sócios e formalizar o conselho.
- Entregável: documento de governança e calendário anual de reuniões.
4) Testes e simulações (6–18 meses)
- Exercícios de transição simulada para validar processos.
- Entregável: relatório com planos de mitigação.
5) Revisão contínua (anual)
- Monitorar indicadores de sucessão: tempo médio para ocupação de vagas críticas, retenção de líderes, aderência ao plano.
- Entregável: painel de indicadores de governança e sucessão.
Métricas que importam (exemplos práticos)
- Percentual de posições críticas com sucessor identificado;
- Índice de aderência ao plano de desenvolvimento (metas cumpridas/ metas planejadas);
- Tempo médio de transição (da decisão formal até a ocupação efetiva);
- NPS interno do processo de sucessão (escuta qualificada de stakeholders).
Monitorar essas métricas transforma uma ideia abstrata em resultados mensuráveis e, além disso, reduz a probabilidade de surpresas.
Erros recorrentes e como evitá-los
Acreditar que sobrenome é competência
É comum assumir que herdeiros têm preparo apenas pelo vínculo familiar. Para evitar, estabeleça uma trilha objetiva de formação, desenvolvimento e avaliação, com experiências práticas e metas claras de aprendizado.
Adiar a sucessão até “ser necessária
Esperar até o último momento aumenta riscos e gera improviso. Crie um cronograma com marcos definidos, incluindo checkpoints para avaliar progresso e o grau de preparação (prontidão) dos sucessores.
Isolar a família do conselho
Excluir a família do processo de decisão pode gerar desalinhamento e resistência. Equilibre a voz familiar com membros independentes e experientes, garantindo decisões técnicas e estratégicas sem conflitos de interesse.
Tratar sucessão apenas como ato jurídico
Limitar a sucessão a transferências de patrimônio ignora o desenvolvimento de líderes e a estratégia empresarial. Integre gestão de pessoas, finanças e planejamento estratégico para que a sucessão seja completa e sustentável.
Herança é consequência, liderança é escolha
Tratar sucessão empresarial como sinônimo de herança é um risco caro. Sucessão é planejamento, governança e desenvolvimento de pessoas e exige disciplina.
Nesse sentido, empresas que institucionalizam esses processos aumentam significativamente as chances de continuidade e crescimento sustentável.
E, por fim, proponho a reflexão: seu conselho está projetando o futuro ou apenas confirmando relatórios?
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